Blogagem Coletiva: o que já deixei de fazer por ser mulher

Pensando neste importante momento de “primavera feminista”, as meninas do Clube de Cartas propuseram, como um dos temas da blogagem coletiva do mês de junho, “o que já deixei de fazer por ser mulher”.
Vejamos... Será que eu devo começar do básico? Sair por aí despreocupada, escolher minha roupa sem pensar duas vezes no que as outras pessoas vão achar, andar de noite na rua, exercer meu direito de ir e vir, ter minha opinião levada a sério por pessoas do sexo oposto... Não, além disso tudo, resolvi focar em uma coisa.
Escolhi uma coisa só. Mas que coisa!
O que eu já deixei de fazer por ser mulher? 
DEIXEI DE SER VALORIZADA PELO QUE EU SOU.
Explicando: cresci numa cultura de culto da imagem muito restrita, antes ainda da invasão nerd e loser das séries que focavam os outcasts. Era uma época pré The Big Bang Theory, pré Glee, pré comemoração do dia da toalha / dia do orgulho nerd. Eram tempos difíceis aqueles.
Eu era gordinha, era (e ainda sou) baixinha e sofria com a odiosa acne. E, por isso, não servia para nada. Sou mulher, era menina, e ouvia que, se ninguém me quisesse “comer”, eu não valia nada. Nem era adolescente, e depois de ser taxada não como a menina mais inteligente da sala (como de fato eu sempre fui), mas sim de mais feia, cheguei a escrever no diário que nem para prostituta eu servia: pra que continuar vivendo, então?
Sou feia, horrorosa? Claro que não. Mas me encaixo no “padrão de beleza”? Não. Seria considerada uma “gostosa” por uma multidão unânime? Não. E isso não me incomoda. A beleza está nos olhos de quem vê, e vale mais ser considerada bonita por quem importa do que lutar pela aceitação de todos e perder a individualidade.
Mas este não é o problema. O problema é que, por ser mulher, a aparência sempre foi – e é – um quesito de grande peso em qualquer julgamento. Não adianta ser inteligente, simpática, bem-humorada, talentosa, se você for uma mulher considerada feia. Ninguém irá lhe valorizar por todas as suas muitas qualidades: só irão lhe botar para baixo por um único defeito.
E isso não acontece só comigo. A maioria não se lembra da tenista que venceu chuva e obstáculos para conquistar um título, se lembra da atleta com celulite, como mostra essa manchete:
"Supera a chuva, mas não a celulite..."
Quando um homem não é considerado “bonito”, ele pode até ter problemas para conseguir um relacionamento amoroso, mas provavelmente terá seu grupo de amigos, que farão piadas sem maldade sobre a feiura dele. Para os homens, entre os homens, a embalagem não importa tanto. Mas quando uma mulher não é considerada “bonita”, além de ter dificuldades para começar um relacionamento amoroso, ela também será motivo de chacota e de fofoca das outras mulheres. Porque, convenhamos, não existe grupo mais desunido que as mulheres (e, sim, estou generalizando).

O mundo mudou depois desta época. Uma onda de aceitação toma conta em especial da internet, e isto é bonito demais de se ver. Mas ainda não chegamos lá: enquanto a mulher ainda for vista e tratada como um objeto, que serve para enfeitar e nada mais, haverá desigualdade. E haverá mulheres deixando de fazer coisas extraordinárias – apenas porque não são bonequinhas de louça, mas moças de carne e osso.

Comentários

  1. Oi Lê, tudo bem?
    É guria, ser mulher não é nem um pouco fácil e conforme "crescemos", as coisas parecem mais complicadas. Na adolescência, eu me destacava pela inteligência, até tinha muitos amigos por isso, mas minha aparência não contribuía muito para a popularidade, mesmo que nessa época eu tivesse mais problemas amorosos do que hoje em dia hahahahah. Atualmente, eu sofro pelo contrário, até sou bonita comparada àquela época, mesmo não tendo o padrão de beleza midiático, mas o tempo todo tenho meu intelecto colocado em cheque, cada dia mais tenho que provar meu valor como ser pensante, mesmo sendo funcionária pública e não precisando exercer concorrência, o que é um paradoxo difícil de entender. Mas, comparada aos meus irmãos, a minha jornada de trabalho é muito maior, o trabalho braçal também, e não tenho o mesmo salário e reconhecimento deles (que merecem, não estou dizendo o contrário) dentro da empresa em que trabalham. É difícil até para eles, que cresceram comigo enxergarem a injustiça da desigualdade entre nossas vidas. Enfim, estou me delongando demais, é que esse assunto é muito complexo e exige demais da gente. Beijo grande!!!

    Blog da Gih

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  2. Adorei o post, realmente ser mulher já nos deixa em desvantagem em muitos quesitos. Achei fantástica a iniciativa dessa postagem coletiva, apesar de não ter tido tempo de participar esse mês :(
    Mas pretendo debater muito mais esse assunto no blog.
    Parabéns por ter abordado o tema de uma forma tão direta, espero que muitas muitas mulheres e homens possam ler este post e refletir...

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