Sentir? Sinta quem lê!
Durante
a pandemia, um companheiro constante foi um livro de poesias de Fernando
Pessoa. Dentre todas, amei A Tabacaria, mas minha favorita foi esta, de Álvaro
de Campos:
ISTO
Dizem que finjo ou minto
Tudo que escrevo. Não.
Eu simplesmente sinto
Com a imaginação.
Não uso o coração.
Tudo o que sonho ou passo,
O que me falha ou finda,
É como que um terraço
Sobre outra coisa ainda.
Essa coisa é que é linda.
Por isso escrevo em meio
Do que não está de pé,
Livre do meu enleio,
Sério do que não é.
Sentir? Sinta quem lê!
Assim como muitos outros escritores, aprendi muita
coisa de experiências. Uma delas, universal, é que uma hora precisamos colocar
o ponto final e por nossa obra no mundo, por mais que queiramos ficar
melhorando e reescrevendo vários trechos.
Outra coisa que aprendi foi que, uma vez
publicada, a obra não é mais só sua: é também de quem lê. Por exemplo: com meu
romance “Anos de Chumbo”, tive respostas que não esperava. Uma leitora
comparou-o com uma novela do SBT, “Amor e Revolução”, e outra com a minissérie
da Globo “Anos Rebeldes”. Já havia ouvido falar de ambos os produtos
audiovisuais, mas não me passou pela cabeça qualquer semelhança. E esta não é
mera coincidência: são associações que os leitores fazem quando se apossam de
nossa escrita.
Pus o ponto final em “Anos de Chumbo” em 2014,
cinquenta anos depois do golpe de 64. Foi ainda antes do lançamento do Portal
Memórias Reveladas da Comissão Nacional da Verdade, que sem dúvida é um recurso
valiosíssimo para a memória do nosso país, mas que não foi usado no livro.
Minha inspiração maior veio das músicas de
protesto feitas durante a ditadura civil-militar, tanto é que compilei as mais
icônicas, junto à outras melodias que têm a ver com a trama do livro, numa
playlist do Spotify.
E assim sigo, surpreendida
sempre pelos meus leitores, e desejando a todos uma boa leitura – e, com a
playlist, também uma boa escuta.
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