Resenha: coletânea de contos “Cor Não Tem Gênero”

 



Desta vez, uma coisa diferente: uma resenha de uma coletânea que reuniu oito autores para contar histórias LGBTQIA+. Em cada parágrafo, algumas impressões sobre os oito textos que li para encontrar inspiração para um conto no qual estou trabalhando.

O primeiro conto, “Tudo que não precisa ser dito”, foi escrito por Luiz Gouveia. Nele, um estudante de uma arcaica escola só para meninos localizada - presumo pelos nomes dos personagens - na Inglaterra ou outro país de língua inglesa se apaixona por um novo colega de classe. Não é a primeira paixão dele por outro menino - sendo que, numa ocasião anterior, seu sentimento foi considerado doença. O conto se passa numa época em que homossexualidade era considerada crime, daí a relação dos meninos estar duplamente em perigo. Tudo parece muito comum no conto, até que chegamos ao clímax: aí há uma divisão, com dois finais possíveis, e cabe ao leitor escolher o final para o amor proibido entre Sebastian e Augustus.

“Camisetas, cores e confusões”, de Danilo Barbosa, é o segundo conto. Nele, uma criatura celestial conta a história de Murilo, um adolescente que comete uma gafe no protesto, organizado por sua melhor amiga Barbs, contra a fala - que não tem nada de “cortina de fumaça” - da nefasta então ministra da Família de que “meninos usam azul, meninas usam rosa”. Felizmente, o que começa mal para Murilo acaba tendo uma reviravolta e um final feliz.


No terceiro conto, meu favorito, - “Swing da Cor”, de Leonardo Antan - acompanhamos Gal, uma pessoa não-binária, narrando em flashbacks e flash-forwards seu relacionamento com uma moça chamada Marina, que em certo momento passa a optar por relações não-monogâmicas. No começo de cada pequeno episódio deste relacionamento, há um verso de uma música, o que dá o tom da história e serve para criar uma playlist bem massa. É um texto envolvente e cheio de passagens que merecem ser destacadas.

“Heróis Nunca Morrem”, de Rafael Ribeiro, é o quarto conto da coletânea. É um texto bem didático, sobre beleza interior e a necessidade de não julgar as pessoas pela aparência. Seu protagonista é Arthur, que joga Overwatch sob o nick Pink Angel e faz transmissões de seus jogos pela web. Um dia, Arthur resolve mostrar o rosto - e a pele impecável - numa transmissão, e aí bate a insegurança e o medo dos haters. Ele terá duas ajudas nessa pequena missão de mostrar quem é: uma ajuda bem de perto e outra mais de longe, mas não por isso menos importante.

O quinto conto é “No Alto das Montanhas”, de autoria de Cínthia Zagatto. Ambientada num acampamento da cidade de Monte Verde, a história contada é a de Téo, novo monitor-mirim no local, que conhece no local Sam, uma pessoa que desafia o binário do gênero. O tempo todo se perguntando se Sam é menino ou menina - embora o conto se refira a Sam como “ela” - Téo vai descobrir que, na vida, alguns detalhes não importam.

Brenda Bernsau assina o sexto conto, “O que tem de mais bonito na vida”. Nele, a adolescente Tainara, deficiente visual, se aproxima da colega de sala andrógina Lorena e passa a sofrer bullying dos colegas. Um conto verdadeiramente sensível, tão sensível quanto o tato e os sons são para a protagonista.

Destoa da coletânea Janaina Rico, que escreve “Meu gênero e arco-íris”. Este não é um conto como os demais, mas sim um comentário crítico aos retrocessos do desgoverno passado. Janaína, entretanto, dá um recado: “Vivo em um mundo de arco-íris, em que posso e devo ter a liberdade de optar pela cor que eu quiser, e minha íris enxerga muito mais que o rosa. Sou azul, lilás, laranja, cinza, vermelha, preta, branca. Sou o que eu quiser ser, visto o que quiser usar, me deixo colorir do jeito que a vida quiser me enfeitar.”

Por fim, Thati Machado escreve “Multicor - Parte 2”. Sim, significa que há uma parte 1, mas você pode ir direto para a parte 2 sem que nada prejudique o entendimento da história, que é dividida em duas partes. Na primeira, acompanhamos a visita de um presidente homofóbico ao Instituto Multicor, um local seguro - até então - para a juventude LGBTQIA+. Qualquer semelhança com uma realidade recente não é mera coincidência. Na segunda parte, temos um resgate de uma criança que estava ameaçada por ser, como fica implícito, de gênero não-binário.

Um comentário geral final: Alguns contos se beneficiariam de uma revisão mais atenta, pois há errinhos de concordância, digitação e pontuação. Apesar disso, é uma coletânea gostosinha de se ler, sem muito compromisso e com algumas boas surpresas no caminho.

O VEREDICTO: 2 MINIONS!


Regular

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