Como foi participar de uma Olimpíada de Literatura

 

Ler, para mim, sempre foi um prazer, mesmo quando eram leituras obrigatórias da escola. Mas na escola havia um lado ruim: o momento da prova sobre o livro lido. Se as questões fossem de múltipla escolha, pior ainda, pois me embananava toda. Mesmo assim, sempre tirei boas notas. Talvez seja por isso que resolvi, depois de anos de formada, me submeter mais uma vez a uma prova literária, desta vez através da participação na sexta Olimpíada de Literatura.

Fiz em março a inscrição para uma prova que ocorreria no começo de maio. Havia quatro categorias: mirim (até 12 anos), junior (até 16 anos), sênior (qualquer idade) e ouro (qualquer idade). Dentro de cada categoria, havia dois livros para serem escolhidos. A outra opção na categoria sênior era Dom Casmurro, que já li há muitos anos, por isso escolhi uma novela considerada obra-prima da literatura russa: “A Morte de Ivan Ilitch”, publicada em 1886 por Liev Tolstói.


 



Apontamentos sobre “A Morte de Ivan Ilitch”

 

Na literatura russa, como comenta o prefaciador, existe a figura do pequeno burocrata, um homem mediano num trabalho medíocre. Ivan Ilitch, seria, ao contrário, um “grande burocrata de alma pequena”.

Nós acompanhamos, no primeiro capítulo, as reações de Piotr Ivánovitch, amigo de infância e companheiro de trabalho de Ivan, à morte do amigo, incluindo a ida ao funeral e a conversa com a viúva Praskóvia Fiódorovna sobre uma indenização governamental. O casamento era de aparências: feliz nos meses iniciais, logo foi minado pelos ciúmes e grosseria de Praskóvia - palavras de Ivan em que somos obrigados a acreditar - e para defender-se dela Ivan passou a concentrar-se no trabalho de juiz de instrução. Para obter uma vida “leve, agradável e decente”, se isola da família e foca mais nas relações oficiais que nas relações humanas.

Mas Ivan não consegui se defender de outro algoz: o pensamento na própria morte, como externado nesse parágrafo:


“ (…) mas que eu,  Vánia, Ivan Ilitch, que eu morra, com todos os meus sentimentos, os  meus pensamentos, é outra coisa. Não é possível que eu tenha que  morrer. Seria horrível demais.  Era o que ele sentia.” 


É então que surge um flashback dentro do flashback dos últimos tempos de Ivan, quando ele encontra alegria apenas nas memórias de infância e passa a crer que viveu de maneira errada, ou em suas palavras: “Tudo aquilo por que você viveu e vive é uma mentira”.

No prefácio, uma verdade: “De fato, se a literatura nos permite viver muitas  vidas, também nos possibilita morrer muitas mortes.” Nas ilustrações, o traço firme e certeiro em preto e branco de Luciano Feijão. Nesta novela publicada em 1886, em meio às novas reflexões espirituais de Liev Tolstói, um lado doutrinador que magicamente se casa com elementos da alta literatura.




 

A Olimpíada de Literatura 

 

Terminei de ler o livro com folga, dois dias antes da prova. No grande dia, teria uma hora para responder a 44 perguntas de múltipla escolha, incluindo aí perguntas de verdadeiro ou falso.

Na tarde de sete de maio, sentei-me para fazer a prova. Acabei levando apenas quinze minutos para as 44 questões, consultando o livro uma única vez, confiando para as demais questões apenas em minha memória. Imediatamente recebi por e-mail meu resultado: acertei 72% das questões. Confesso: foi menos do que costumava acertar nas provas da escola, mas não cheguei a ficar chateada. Afinal, tudo é experiência.

Não ganhei medalha, nem menção honrosa, mas gostei muito de participar da Olimpíada de Literatura. Se participaria novamente? Mas é claro!

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